quarta-feira, 1 de abril de 2015

O sentimento de amar segundo Drummond

Amar se aprende amando.
Assim mesmo, em tom afirmativo e de frase já disposta a uma lição, é esse o título de um dos livros de Carlos Drummond de Andrade.

Considero Drummond um típico caso de escritor cujos títulos dos livros por si só já são obras de literatura e de poesia. Ele angaria um conjunto dos mais belos títulos de livros da nossa literatura brasileira. Ousaria até supor que, Drummond, para muitos que nunca leram nada escrito por ele, nem mesmo um dia ouviu falar seu nome, conseguiria obter leitores para seus livros, simplesmente despertos por uma curiosidade admirada pelos belos títulos de seus livros. 

Os títulos de Drummond são convidativos à leitura. Tire a prova: você mesmo, sem o obstáculo de algum preconceito literário ou pelo autor, passeando por uma estante com estes títulos do escritor mineiro, ficaria indiferente às chamadas: Sentimento do mundo, Fazendeiro do ar, Discurso de primavera e algumas sombras, Esquecer para lembrar, O amor natural, A cor de cada um?  

A simpatia do escritor e de sua obra começam logo nos títulos, logo nesta capacidade que ambos, livros e autor, têm de convidar sem conhecer, de atrair em encanto sem grandes rodeios. Desde o primeiro contato com Drummond, a experiência é de aproximação lírica, sem mesmo darmos conta por inteiro de tanto.

Uma de suas características pessoais - e que também será de sua poesia - que mais me deixaram lembrança quando do meu primeiro contato mais detido e maduro com a vida e obra de Drummond, foi o seu manifesto sentimento de responsabilidade diante do mundo. Certa vez ele assim sentenciou: "entendo que poesia é negócio de grande responsabilidade". E para além da sentença, ele inaugurou a pesada e muito bela expressão: sentimento de mundo. Imaginemos nós o peso de ter o sentimento do mundo. 

Lembro-me que a figura de Drummond, desde o momento que me apresentou a esse enunciado forte, logo instalou-se em minha lembrança assemelhado à imagem do Atlas,  figura da mitologia grega, já que este último também não tinha outro desempenho menos belo e pesado que o de suportar o globo em suas costas. Atlas e Drummond, ambos, tiveram por desígnio, se autoimposto ou não, viver para sustentar o mundo.

Pois que ainda nessa competência de sentir o mundo, o poeta Drummond assim afirmou em título: amar se aprende amando. E a partir de tal afirmação, o senhor crítico Ivan Junqueira disse algo relevante e sério em seu prefácio ao referido livro, que nos permite desde logo nos preparar para uma das lições de maior valor da totalidade dos poemas drummondianos desta obra. Disse Junqueira: "Sob o título de Amar se aprende amando se colhem de imediato duas raras lições: uma primeira, de ousada simplicidade e que se dá logo à tona de seu enunciado, onde o autor se permite a audácia de reunir três versos, cada um deles em voz distinta; e uma outra, mais funda e talvez difícil, que nos ensina essa prática (tão trivial não fosse hoje absurdamente anacrônica) cuja eficácia reside apenas na elementar e irretorquível verdade que só se aprende mesmo fazendo." 

Pois bem, assim o poeta postulará outra vez: nesta existência de tantas experiências, de exigência de experimentar e viver tanta coisa, cada aspecto de nossas vidas só é por definitivo conhecido, sabido em essência, em um termo: vivido; fazendo, praticando. Com o amor, aspecto protagonista de nossas existências, não poderia se dar de forma diferente.  

Em Amar se aprende amando, o estimado poeta direciona a atenção da máxima do "aprender fazendo" exclusivamente para o amor. O sentimento comum entre todos os seres da natureza, mas só vivido conscientemente pelos seres humanos, também exige aprendizado. O amor só se faz, amando; e amar, se aprende. Só se ama, amando, só se sabe amando, e só se sabe amar, fazendo-o, isto é, amando. Quantas afirmações contidas em uma frase só! Dessas afirmações, por fim, emerge uma conclusão: o amor encerra um elemento de prática e ação. Por essa razão ele só se realiza no fazer, no sentir, no amar (todas essas, ações e práticas). 

Esse sentido de moção e ação, destacados do amor pelo poeta, são logo introduzidos no lindo poema anúncio dos demais, eleito epígrafe do livro: 

"O amor que move o sol,
como as estrelas".
O verso de Dante
é uma verdade resplandecente
e curvo-me ante sua magnitude.
Ouso insinuar,
sem pretensão a contribuir
para que se desvende o mistério amoroso:
Amar se aprende amando
Sem omitir o real cotidiano,
também matéria de poesia.

Amor como ação e moção. Ação é moção. Para Dante, o amor, move, portanto, é ação. Em Drummond, o amor é ação, e a ação assume ainda o caráter de aprendizado. Para o poeta, definitivamente: amar se aprende amando.

Esse ensinamento insinua-se e continua nos demais poemas contidos em seu livro, e em minha observação, ele primeiro se dá de forma bastante particular e direcionada para o sentimento do amor romântico, depois, aos poucos, vai sendo estendido para o sentimento de amor de amizade, e, por fim, assume a feição daquele sentimento de amor universal, advindo de ações (amor: sempre ação!) para o bem de uma coletividade; nesta hora, os poemas se permitirão esbarrar-se nas questões políticas e também estarão mais imersos nos problemas sociais da geração de Drummond - a qual não está tão longe da nossa, e a nossa, destituída por completo dos problemas da geração do mineiro poeta do século vinte. 

Eu concluiria minha consideração à esse livro de Drummond, sobretudo à forma como ele foi organizado pelo escritor - se consciente ou inconscientemente - apontando que até a feliz direção e ordem dos poemas resultou em lirismo, e combinou com o sentimento de amor, pois que, como é sabido, e sobretudo sentido por todos, o amor, desde a sua fase semente, traz em germe a disposição à expansão e à abrangência. O amor está sempre em movimento; seu combustível sempre é a ação, amar; e seu caminho é sempre de ascensão.

Aqui deixo uma seleção pessoal de alguns poemas do belo Amar se aprende amando (Rio de Janeiro: Record, 1985). Consultei a 29ª edição da obra, saída em 2005, também pela editora Record; logo, a paginação indicada abaixo de cada poema se refere a essa edição.

Boa leitura!


RECONHECIMENTO DO AMOR

Amiga, como são desnorteantes
os caminhos da amizade.
Apareceste para ser o ombro suave
onde se reclina a inquietação do forte
(ou que forte se pensava ingenuamente).
Trazias nos olhos pensativos
a bruma da renúncia:
não querias a vida plena,
tinhas o prévio desencanto das uniões para toda a vida,
não pedias nada,
não reclamavas teu quinhão de luz.
E deslizavas em ritmo gratuito de ciranda.

Descansei em ti meu feixe de desencontros
e de encontros funestos.
Queria talvez -sem o perceber, juro -
sadicamente massacrar-te
sob o ferro de culpas e vacilações e angústias que doíam
desde a hora do nascimento,
senão desde o instante da concepção em certo mês perdido na História,
ou mais longe, desde aquele momento intemporal
em que os seres são apenas hipóteses não formuladas
no caos universal.

Como nos enganamos fugindo ao amor!
Como o desconhecemos, talvez com receio de enfrentar
sua espada coruscante, seu formidável
poder de penetrar o sangue e nele imprimir
uma orquídea de fogo e lágrimas.
Entretanto, ele chegou de manso e me envolveu
em doçura e celestes amavios.
Não queimava, não siderava; sorria.
Mal entendi, tonto que fui, esse sorriso.
Feri-me pelas próprias mãos, não pelo amor
que trazias para mim e que teus dedos confirmavam
ao se juntarem aos meus, na infantil procura do Outro
o Outro que eu me supunha, o Outro que te imaginava,
quando - por esperteza do amor - senti que éramos um só.

Amiga, amada, amada amiga, assim o amor
dissolve o mesquinho desejo de existir em face do mundo
com olhar pervagante e larga ciência das coisas.
Já não defrontamos o mundo: nele nos diluímos,
e a pura essência em que nos transmutamos dispensa
alegorias, circunstâncias, referências temporais,
imaginações oníricas,
o voo do Pássaro Azul, a aurora boreal,
as chaves de ouro dos sonetos e dos castelos medievos,
todas as imposturas da razão e da experiência,
para existir em si e por si,
à revelia de corpos amantes,
pois já nem somos nós, somos o número perfeito:
UM.
Levou tempo, eu sei, para que o Eu renunciasse
à vacuidade de persistir, fixo e solar,
e se confessasse jubilosamente vencido,
até respirar o júbilo maior da integração.
Agora, amada minha para sempre,
nem olhar temos de ver nem ouvidos temos de captar
a melodia, a paisagem, a transparência da vida,
perdidos que estamos na concha ultramarina de amar.

[p.19-21]


LIRA DO AMOR ROMÂNTICO
               Ou a eterna repetição

Atirei um limão n'água
e fiquei vendo na margem.
Os peixinhos responderam:
Quem tem amor tem coragem.

Atirei um limão n'água
e caiu enviesado.
Ouvi um peixe dizer:
Melhor é o beijo roubado.

Atirei um limão n'água
como faço todo ano.
Senti que os peixes diziam:
Todo amor vive de engano.

Atirei um limão n'água,
como um vidro de perfume.
Em coro os peixes disseram:
Joga fora teu ciúme.

Atirei um limão n'água
mas perdi a direção.
Os peixes, rindo, notaram:
Quanto dói uma paixão!

Atirei um limão n'água,
ele afundou um barquinho.
Não se espantaram os peixes:
faltava-me o teu carinho.

Atirei um limão n'água,
o rio logo amargou.
Os peixinhos repetiram:
É dor de quem muito amou.

Atirei um limão n'água,
o rio ficou vermelho
e cada peixinho viu
meu coração num espelho.

Atirei um limão n'água
mas depois me arrependi.
Cada peixinho assustado
me lembra o que já sofri.

Atirei um limão n'água,
antes não tivesse feito.
Os peixinhos me acusaram
de amar com falta de jeito.

Atirei um limão n'água,
fez-se logo um burburinho.
Nenhum peixe me avisou
da pedra no meu caminho.

Atirei um limão n'água,
de tão baixo ele boiou.
Comenta o peixe mais velho:
Infeliz quem não amou.

Atirei um limão n'água,
antes atirasse a vida.
Iria viver com os peixes
a minh'alma dolorida.

Atirei um limão n'água,
pedindo à água que o arraste.
Até os peixes choram
porque tu me abandonaste.

Atirei um limão n'água.
Foi tamanho o rebuliço
que os peixinhos protestaram:
Se é amor, deixa disso.

Atirei um limão n'água,
não fez o menor ruído.
Se os peixes nada disseram,
tu me terás esquecido?

Atirei um limão n'água,
caiu certeiro: zás-trás.
Bem me avisou um peixinho:
Fui passado pra trás.

Atirei um limão n'água,
de clara ficou escura.
Até os peixes já sabem:
você não ama: tortura.

Atirei um limão n'água
e caí n'água também,
pois os peixes me avisaram,
que lá estava meu bem.

Atirei um limão n'água,
foi levado na corrente.
Senti que os peixes diziam:
Hás de amar eternamente.

[p. 27-31]


O AMOR ANTIGO

O amor antigo vive de si mesmo,
não de cultivo alheio ou de presença.
Nada exige nem pede. Nada espera,
mas do destino vão nega a sentença.

O amor antigo tem raízes fundas,
feitas de sofrimento e de beleza.
Por aquelas mergulha no infinito,
e por estas suplanta a natureza.

Se em toda parte o tempo desmorona
aquilo que foi grande e deslumbrante,
o antigo amor, porém, nunca fenece
e a cada dia surge mais amante.

Mais ardente, mas pobre de esperança.
Mais triste? Não. Ele venceu a dor,
e resplandece no seu canto obscuro,
tanto mais velho quanto mais amor.

[p. 32]


O QUE ALÉCIO VÊ

A voz lhe disse (uma secreta voz):
- Vai, Alécio, ver.
Vê e reflete o visto, e todos captem
por teu olhar o sentimento das formas
que é o sentimento primeiro - e último - da vida.

E Alécio vai e vê
o natural das coisas e das gentes,
o dia, em sua novidade não sabida,
a inaugurar-se todas as manhãs,
o cão, o parque, o traço da passagem,
de pessoas na rua, o idílio
jamais extinto sob as ideologias,
a graça umbilical do nu feminino,
conversas de café, imagens
de que a vida flui como o Sena ou o São Francisco
para depositar-se numa folha
sobre a pedra do cais
ou para sorrir nas telas clássicas de museu
que se sabem contempladas
pela tímida (ou arrogante) desinformação das visitas,
ou ainda
para dispersar-se e concentrar-se
no jogo eterno das crianças.

Ai, as crianças... Para elas,
há um mirante iluminado no olhar de Alécio
e sua objetiva.
(Mas a melhor objetiva não serão os olhos líricos de Alécio?)
Tudo se resume numa fonte
e nas três menininhas peladas que a completam,
soberba, risonha, puríssima foto-escultura de Alécio de Andrade,
hino matinal à criação
e à continuação do mundo em esperança.

[p. 45-46]


VERSOS PARA ANA CECÍLIA DO RECIFE

Eis que o tempo chegou de celebrar Ana Cecília
e sua graça-clarão e seu verdor de tília.

Aqui estou, velho poeta, para quem a juventude
traz em si mesma uma promessa de beatitude,

uma continuação de antes de amanhecer, uma fonte
de sonhos e visões a colorir a linha do horizonte,

um aceno forte de vida, incitando a viver
a magnificente esperança de cada hora, diamante do ser.

Aqui estou e vejo Ana Cecília em seu fluvial Recife
adornada de mocidade como de um paquife.

Tem sua própria e luminosa florescência,
a mesma de Sônia Maria e de Madalena, e a inefável ciência

das moças brasileiras do passado, refletidas na de 78,
dom contra o qual nada pode nem ousa o tempo afoito,

pois a moça, forma indelével, através de gerações e gerações,
sítios, histórias, alianças, amorosas combinações,

é eternidade no fluir das coisas, instante corporizado
da ânsia de vencer o efêmero e nele inscrever o traçado

de uma parte ponta entre o humano, o terrestre e o transcendental,
feições todas irmanadas de um fantástico ideal.

E tudo que vejo em Ana Cecília é a imagem dessa união
profunda, como profundo é o amor, e plena de canção.

Que verso darei a Ana Cecília, se ela é o próprio verso
a brotar, espontâneo, da música do universo?

[p. 50- 51]


EU QUISERA VER O MUNDO

Eu quisera ver o mundo
como o vê Sérgio Bernardo:
ver, no mundo, os muitos signos
que vigiam sob as coisas.

Sentir, sob a forma, as formas,
os segredos da matéria,
mais a textura dos sonhos
de que se forma o real.

Ver a vida em plenitude
e em seu mistério mais alto;
decifrar a linha, a sombra,
a mensagem não ouvida

mas que palpita na Terra.
Eu quisera ter os olhos
que assim penetram o arcano
e o tornam (poder da imagem)

um conhecimento humano.

[p. 54]


O ESCRITOR

Alceu e Tristão: o nome
e o pseudônimo ensinam
uma unidade de alma
na unidade do amor.

Pois é o amor unidade
multiplicada, e a vida
quando se recolhe aos livros
é para voltar mais vida.

Em 50 anos de letras
uma flor desenha as pétalas
de amoroso convívio:
o homem livre e ligado.

Livre e ligado a seu próximo
na larga avenida humana
em que beleza e justiça
fazem de espera, esperança.

Tristão e Alceu: a mesma
fiel cristalinidade:
uma criança sorrindo
no sábio à sombra de Deus.

[p. 77]


NOVA RUA SÃO JOSÉ
                         11. VIII. 1973

Cultivando o prazer de andar a pé,
tiro de meus alforjes lexicais
o mais puro louvor a Gildo Borges,
renovador da Rua São José.

Quem ali passa logo se detém,
senta no banco (banco de sentar,
não de pagar imposto e duplicata)
e escuta, embevecido, uma sonata.

De que piano vem, música errante,
se não vejo instrumento musical?
Vem de sentir no ar essa aliança
entre a cidade e a forma natural.

É pedaço de rua, por enquanto,
mas nele se devolve à criatura
o pouso, a paz, a pomba, o pensamento
de existir, existindo com doçura.

Em seus vasos, a múltipla folhagem,
ainda tímida, pede-nos licença
para nos ofertar sua presença
consoladora do monstro-garagem.

A flor, em flor, na rua - que convite
ao passante angustiado: "Pára um pouco.
Dez ou quinze minutos de far-niente
e voltarás depois ao mundo louco.

Mas voltarás de cuca restaurada,
alma leve, levando na lembrança
um bailado de asas e a dourada
alegria da hora lenta e mansa.

Aqui não te perseguem carro trêfego,
maléfica fumaça, rumor túrbido,
aqui encontrarás paradisíaca
pasárgada de pobre e milionário.

Aqui é teu domínio; aqui és rei
de teu nariz, das nuvens e da aves,
e fruirás o simples estar quieto,
erigindo o relax em tua lei".

Assim murmura a flor, e corre a brisa,
"Apoiado", ciciando ao perpassar,
enquanto São José, na sua igreja,
e Tiradentes põem-se a meditar

(pois estátua medita) e os dois reunidos
aprovam Gildo Borges e seu sonho
de tornar a cidade mais humana
e cada ser humano mais humano.

[p. 123 -124]


A AMIGA VOLTOU
                         17.I.1981

Muitas promessas não foram cumpridas nos últimos doze meses.
Eu mesmo, ativo cobrador de promessas,
terei prometido e faltado
no mínimo sete vezes por semana
e, o que é pior,
ostentando indefectível cara-de-pau.
Homens enganaram homens e mulheres
com voz de flauta doce:
"Vou fazer isso, vou fazer aquilo,
vocês têm de confiar neste compatriota..."
Fez? Pois sim, seu Serafim.

Mas essa amiga prometeu e cumpriu:
"Tou de volta em janeiro".
E tá. No Parque do Flamengo;
como anunciara. E um pouco
por toda parte: Iúca
e sua branca floração em cachos.

Temia que não viesses mais,
Iúca. As coisas andam pretas,
e tuas alvas panículas contrastantes
com o negro sobrecenho
deste Rio assustado
podiam parecer provocação.
Mas sorriste do medo.

Chegaste, amiga nossa,
pontual,
lirial,
janeiramente abril.

É consolo, conforto
saber que não mudaste
e restauras em nós a matutina esperança
de ter um dia bonito à nossa frente.
Pronto, ganhei o dia,
só de te ver e de beijar com os olhos
tua florada em forma de turíbulo
ou lâmpada suspensa.

Assim fazem as plantas,
honradas, tranquilas companheiras
neste viver em grupo, conturbado.
Não seguem portarias
nem do Banco Central nem do Conselho
Interministerial de Preços Altos.
Têm seu próprio destino prefixado
(Não correção incerta monetária),
e a ele são fiéis. Fiel Iúca,
a trabalhar de graça para os pobres
olhos da população carente de feijão,
de sossego, de carne e de carinho.
Não tens partido, entre os partidos,
tão repartidos que hoje se emaranham
na tentativa de comprar o passe
de partidários outros e volúveis.
Iúca, tua glória
não resulta de novelas
nem de estádios, palácios, ministérios
de trombeteada fama nacional.
És apenas tu mesma, arbusto digno
que promete florir e cumpre
na hora certa o verde prometido.

Muito obrigado, amiga.
Eu precisava bem deste reencontro.
Nós precisávamos bem deste reencontro.
A folha de rija ponta espiniforme
não molesta ninguém: prepara a flor
inumerável, ofertada
ao dia brasileiro angustiado.

[p. 157]

2 comentários:

Eve disse...

O Sr. Carlos sempre tem belas reflexões! Fiquei encantada com a sua seleção de poemas.
E tive um ataque de fofura com "Lira do amor romântico".
Belo texto, Bruna!
Abraços,
Eve

Bruna Caixeta disse...


Vê, sabe que eu também achei de uma fofura tamanha "Lira do amor romântico"?! Entre os poemas da seleção, ele figura nos meus mais preferidos.

A "Lira" tem uma particularidade que considero uma belezinha e gostosura frente aos demais: é estruturado a partir do que aqui darei o nome de "ciranda infantil"; sim, estou afirmando que o poema é quase uma cantiga de roda. O que me diz?

Para completar o tom da ciranda infantil, em conteúdo, o poema carrega um quê de criança teimando e aprendendo a lição, o que vem a mostrar da forma mais genuína possível, como é sempre similar à posição de crianças - ou, com sentimento de infância e ingenuidade -, que tornamos a lidar com o amor. A despeito de experiências dolorosas, surgido uma vez mais o sentimento amoroso, estamos nós lá de novo tal qual criança tomando risco, repetindo tudo de novo, teimando, como se, por instantes, tudo nos fosse inédito e inofensivo.

"Lira" é melódico, poético, bonito. É lira lírica.

Ah, esse senhor Carlos é mesmo engenhoso! ...

Óh, um abraço pro cê (ao tom mineiro!rsrs), minha querida! Abraço pela visita e comentário envolvido.