sexta-feira, 6 de abril de 2012

Fictício porto

Pescadores e o mar, William Turner, 1796.


I many times thought Peace had come                            Pensei que a Paz já tinha vindo
When Peace was far away -                                               E longe a Paz estava -
As Wrecked Men - deem they sight the Land -                Náufrago - que julgou ver Terra -
At Centre of the Sea -                                                           Lá no Meio do Mar -


And struggle slacker - but to prove                                    E a refrear o esforço - nota
As hopelessly as I -                                                                Como eu - desesperada - 
How many the fictitious Shores -                                       Quanta fictícia Praia ainda
Before the Harbor be -                                                          Até no Porto estar -


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Mas, quando a Aurora, de tranças bem feitas, mais um fez que viesse,
eis que de súbito o vento se aplaca e tranquila se estende
a calmaria. Com vista aguçada distingue o guerreiro,
do alto de uma onda maior, que bem perto já a terra se achava.
Bem como filhos que à vista do pai muito alegres se mostram,
que por doença jazera a sofrer muitas dores atrozes,
por longo tempo abatido, que nume funesto persegue,
alegremente se vê pelos deuses liberto das dores:
dessa maneira Odisseu se alegrou, quando viu terra e matas,
pondo-se ansioso a nadar, porque a terra com os pés alcançasse.
Mas, ao chegar a distância de grito, somente, da praia, 
bem claro ouviu o barulho do mar ao quebrar-se nas pedras;
ondas enormes troavam de encontro à aridez do terreno,
com fragor grande, espalhando-se em tudo alva espuma salgada,
Portos enseadas e abrigos em parte nenhuma se viam,
mas promontórios talhados na pedra, alcantis e rochedos.
O coração de Odisseu se abalou, fraquejaram-lhe os joelhos.
Vendo-se em tanta aflição, ao magnânimo espírito fala:
"Pobre de mim! Já que Zeus me concede ver terra tão perto,
sem que o pensasse, e consigo vencer a voragem do abismo,
não vejo meio nenhum de livrar-me do mar pardacento.
Tudo é cercado de pedras a prumo, e em redor vêm quebrar-se
ondas ruidosas, que molham as rochas erguidas e nuas.
A água é profunda demais, sem que ponto ofereça onde eu possa
firmar os pés para, alfim, conseguir escapar dos perigos.
Muito receio que uma onda me apanhe ao tentar sair da água
e contra as pedras me atire. Será todo o esforço baldado.
Mas, se, nadando, costear ainda um pouco, até ver se é possível
porto abrigado encontrar, ou lugar de viável aclive,
temo que mais uma vez a voragem das ondas me trague,
e para o oceano piscoso me arraste por entre gemidos,
ou que demônio potente do mar contra mim um dos monstros
faça atirar-se, dos muitos que a ilustre Anfitrite alimenta.
Sei quando se acha zangado comigo o que a terra sacode".
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Respectivamente: 


- DICKINSON, Emily. Alguns Poemas de Emily Dickinson. Trad. José Lira. São Paulo: Iluminuras, 2008, p. 59.
- HOMERO. Odisseia. Trad. Carlos Alberto Nunes. São Paulo: Melhoramentos, s/d, pp. 89-90 (Canto V, versos 390 a 424).

2 comentários:

Lívio disse...

Bruna, fácil, fácil perceber que suas leituras estão sendo profícuas, bem como sua capacidade de fazer elos entre diferentes textos, gêneros e autores. Belas postagens intertextuais, que, por fim, acabam revelando temas profundamente comuns, que, por fim, acabam nos revelando.

Bruna Caixeta disse...

Oi, Lívio!

Obrigada pela observação. Legal ouvir o que você disse, de você, quem foi meu professor - e é ainda, mesmo que não oficialmente.

Um grande abraço.