domingo, 15 de janeiro de 2012

Fragmentos (8)

MEFISTÓFOLES
Não será esse amor, fiel, sublime e eterno,
A força portentosa e única da vida,
Do íntimo do peito a aflorar dolorida?

FAUSTO
Já o sinto puro e terno.
[...]
A esse fogo intenso em que tanto me inflamo
De Infinito, de Eterno e Sempiterno chamo.
[...]


      NO JARDIM

(Fausto conduz Margarida pelo braço. Mefistófoles e Marta passeiam em sentido contrário). 


MARGARIDA
Percebo muito bem, o senhor procurar-me,
Com todo esse cuidado a fim de não humilhar-me.
É homem tão viajado, está habituado
A usar de bondade e a ser bem delicado.
Já sei que a uma pessoa assim experiente
Minha pobre conversa em nada é atraente.

FAUSTO
Uma palavra tua, um olhar com tal inocência
Tem muito mais valor, no mundo, que a ciência.

[...]

(Passam andando.)

FAUSTO
Não me reconheceste, oh meu anjo querido,
Quando entrei no jardim, aflito e comovido?

MARGARIDA
Não viste? é que baixei os olhos com pudor.

FAUSTO
Perdoaste a liberdade, a audácia, o destemor,
Que tive, na saída, há dias, da igreja?

MARGARIDA
Fiquei em confusão, não estou habituada.
De mal ninguém dirá, de mim, o que quer que seja.
Ah! depressa pensei, viu ele em tua conduta
Algo de provocante ou pouco recatada?
Pareceu-me investir, com alma resoluta
E com a moça falar e logo acompanhá-la.
Confesso todavia! Não sei como explicá-la,
Uma coisa me fez julgá-lo com ternura.
Comigo me zanguei - e o digo com franqueza -
Por não poder fazer-lhe uma indelicadeza.

FAUSTO
Querida, como és pura!

[...]

MARGARIDA (aperta-lhe as mãos, larga-as em seguida, e corre; ele vacila um momento, depois a segue.)

MARTA (aproxima-se)
Nele, o amor é profundo.

MEFISTÓFOLES
Sim. E nela também. Assim prossegue o mundo.


GOETHE, Johann Wolfgang von. Fausto. Trad. Sílvio Meira. São Paulo: Abril Cultural, 1983, pp.156-165.

Nenhum comentário: