quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Lua de Papel


O filme Lua de Papel ("Paper Moon", EUA, 1973) é uma comédia construída sobre fatos, aparentemente, nada cômicos.

Durante o enterro da mãe de Addie Loggins (Tatum O' Neal) - uma menina de 9 anos, aparece Moses Pray (Ryan O' Neal), quem se propõe a levar Addie para a casa de uma tia, responsável pela órfã. Moses aparece no velório e se interessa pela menina, apenas porque ele já sabia da existência de certa quantia de dinheiro reservada para a criança, a ser pêga no meio do percurso até a casa da parente de Addie.

Moses é um vigarista já habituado a ganhar a vida em circunstâncias de mortes. Sua "profissão" é vender edições especiais da Bíblia para viúvas, em cujas capas vinha gravado o nome das mulheres. Convencia-as a comprar o livro sagrado, alegando que os maridos recém-mortos tinham encomendado a tal Bíblia e pretendiam dá-la de presente para elas, embora eles não a tivessem pago ainda. Muito cretino, Moses descobria essas viúvas porque sempre andava com o jornal aberto nas notas de óbito, onde havia os nomes completos das esposas e seus falecidos maridos.

Acontece que quando Moses tenta seu golpe de vigarista com Addie, não funciona. Ele rouba o dinheiro que a menina nem sabia que era seu, e gasta-o numa loja de peças de carro. Só que numa conversa com o lojista, a menina entende que o dinheiro que Moses havia gastado era dela. Para surpresa do adulto, a criança passa a exigir o seu dinheiro. E ele, então, muito sem graça e aborrecido pela desenvoltura, insistência e esperteza dela, resolve angariar tal quantia na venda de Bíblias. A partir de então, Addie passa a acompanhar Moses nas suas trapaças. E, a cada contato dele com as viúvas, bem como com outras pessoas, e em outras situações, a menina vai descobrindo, e aprendendo muito bem, o mundo de sabotagem, esperteza, maldade e vícios que muito existia nas relações de Moses e dos adultos. Esta observação atenta da criança sobre as atitudes e intenções de Moses, logo a torna capaz de ser participante dos golpes.

Jogando com o inesperado e não politicamente correto - caracterização que, inclusive, já foi muito atribuída ao filme -, o diretor coloca como consequência da observação da vilania adulta, por parte da criança, o envolvimento infantil, e não discursos moralistas. Todavia, ao optar por colocar a criança repetindo um universo pernicioso, não abandona cenas sutis de alta sugestão aos valores humanos. É o caso do retrato da  compaixão e do discernimento de Addie pela condição de um viúva com muitos filhos. Numa cena em que uma mãe, rodeada de crianças, abre a porta para receber Moses e Addie, a menina se vê incapaz de deixar que Moses engane a mulher, e chega a dar a Bíblia de graça para ela.

A companhia de Addie na vida de Moses rende também (e, de forma dominante)situações engraçadas e de mostra da sagacidade infantil.  Uma das melhores é quando a menina tem a iniciativa de por fim no relacionamento de Moses com uma dançarina (Madeline Kahn), que só se aproximara dele para lhe tirar dinheiro. Addie articula todo um plano valendo-se dos vícios dos envolvidos. Ganha a dançarina alimentando a sua cobiça, e um funcionário de hotel, pela luxúria. Faz com que os dois sejam descobertos, por Moses, quando estão juntos no mesmo quarto de hotel. Aliás, essa capacidade da criança Addie observar exatamente qual o vicío, a fraqueza dos adultos, e ser capaz de utilizá-lo a favor ou contra eles, não é só indicativo de esperteza, mas é o que a coloca também distanciada dos adutos, e/ou, não tão totalmente imersa no mundo sujo deles.

É válido saber que o filme é ambientado no contexto da Grande Depressão (Crise de 1929) dos Estados Unidos. Mas, associar esse dado com as malandragens da dançarina e de Moses, tornando-o uma justificativa para aceitação dos atos traiçoeiros desses personagens, é inviável. A época da crise financeira é mais propícia para a busca do dinheiro rápido e fácil, mas, penso eu, não serve de justificativa para a malandragem e atitudes traiçoeiras.  

Lua de Papel, apesar de ser uma produção da década de 70, foi todo feito em preto e branco, por opção de Peter Bogdanovich, o diretor. Outra fato não-convencional, e que certamente, para o censura e a moral contemporâneas seria inadmissível, são as cenas que Addie, a menininha de 9 anos, fuma.

Para aqueles que não conhecem o filme, afirmo que vale muito a pena assisti-lo. Não somente pela desenvoltura da menina Tatum O' Neal - que, inclusive, foi a criança mais jovem a ganhar um Oscar - e a atuação de Ryan O' Neal - pai de Tatum, na vida real -, mas  para se descobrir o motivo, muito engenhoso e bonito, dessa história toda render um título como o de Lua de Papel.

9 comentários:

Christiane Rocha disse...

Oi Bruna!
Vi este filme há tanto tempo e ,lendo seu blog (um texto primoroso, que só vc mesmo sabe fazer!), lembrei-me de algumas cenas e deu vontade de revê-lo.Será que tem disponível em locadoras? E valeu demais a boa dica!
Abraço enorme!
Chris

Christiane Rocha disse...

Ah! Ótima escolha da foto-o Ryan O'Neil é...lindo!A beleza dele é um poema, um inspiração(rsrsrs).Joga no time de Paul Newman e Robert Redford(todos contemporãneos de O'Neil).

Bruna Caixeta disse...

Oi, Chris!

O filme é mesmo bacana. Vale demais a pena ser revisto. Só não saberia te informar se nas locadoras de Patos há o "Lua de Papel". Vi-o foi pela TV. Em todo caso, não deixe de vasculhar.

E você dizendo que o Ryan O'Neal é da mesma época do Robert Redford e do Paul Newman. Acredita que quando vi o Ryan O'Neal neste filme,jurei que fosse o Paul Newman? Achei-os muito parecidos. E, de fato, ele (assim como os contemporâneos dele,citados por você) são bonitos.

Obrigada pela participação, Chris.

Abraços apertados.

Manoel Almeida disse...

Bruna,comecei a ver esse filme há muito anos e por algum motivo (provavelmente pelo horário) não assisti até o final. Graças a você, agora tenho um ótimo motivo para fazê-lo.

Abraços.

Bruna Caixeta disse...

Veja-o mesmo, Manoel.

Obrigada pela presença.

Abraços.

Lívio disse...

Valeu pela indicação, Bruna; não conheço (ainda) o filme.

Bruna Caixeta disse...

Não deixe de conferi-lo, Lívio. É um barato.

Um abração.

Aninha disse...

Começo falando de saudade, Bruna, e quanta!
Uma contribuição pra quem pretende ver o filme Lua de papel e não conseguir encontrá-lo nas locadoras. Ele está disponível no site Filmes com Legenda: http://filmescomlegenda.net/fcl/filmes/lua-de-papel-paper-moon-1973-dvd-rip/
Basta ter o programa UTorrent, e iniciar o download. Eu farei o meu agora mesmo, porque também não conheço - ainda - o filme. Parabéns, pelo blog, uma vez mais, amiga-irmã. Por mais que demore, em virtude da correria dessa vida louca, vez ou outra apareço, para conferir. Forte abraço! Ana Graziela

Bruna Caixeta disse...

Oi, Aninha!

Que surpresa feliz tê-la por aqui! Tenho muita saudade de você também, minha amiga-irmã. Sinto muita falta da sua presença e das nossas conversas.

Agradeço demais por você ter feito a gentileza de compartilhar conosco o link para download do filme "Lua de Papel". Será até uma oportunidade para eu me iniciar neste "mundo do download de filmes". Ainda não mexi com isso. Vou tentar começar por este filme.

Obrigada pela presença. E sempre que possível, apareça por aqui.

Forte abraço.