segunda-feira, 20 de agosto de 2012

À Beira do Caminho



 

        Uma das funções das crianças parece mesmo a de devolver aos adultos a sensibilidade que perdem por aí, nos assomos penosos da vida. Na história do filme À Beira do Caminho (Brasil/2012), Duda (Vinícius Nascimento) vem amolecer o seixo do coração do austero João (João Miguel), quando, após surgir no baú do caminhão deste último, altas horas no meio de uma estrada escura e deserta do nordeste brasileiro, passa a ser companheiro de viagem e superação dos traumas da vida de João.
        João, após ter perdido a esposa em um acidente de carro na noite de ano novo, enquanto a traía com outra mulher, Rosa (Dira Paes), condena-se, ainda jovem, a afastar-se da vida que levava, da cidade natal, dos amigos e da própria filha, ingressando numa viagem sem destino pelo Brasil afora. A viagem, que parece sem fim, passa a constituir-se a vida de João, que anulando qualquer cuidado com ele mesmo, lega-se a indigente morada de um caminhão e a comida de qualquer canto das estradas que percorre. Impiedosa, a atitude de uma vida vivida assim parece insinuar-se como uma auto-punição a qual ele mesmo se condena pelo ato "errado", cometido na noite de virada de anos.
        A condenação que se impõe transforma sua aparência em pouco tratada, abatida e taciturna, e o faz um homem de quase só monossílabos e gestos ríspidos. Assim parece ser há muitos anos, até que Duda imiscui-se à sua viagem, que outra coisa não é que sua vida de condenação.
       Inicialmente, o menino não é aceito de forma nenhuma por João; ele tenta deixar o garoto na delegacia e nem suporta a conversa dele. Conforme o tempo vai passando, em função das tentativas frustradas de entregar o garoto a alguém, João é forçado a conviver com o menino, que, após as investidas constatantes e simpáticas de conhecer mais da história do homem triste, e fazer-lhe saber da sua, cativa-o final e definitivamente. A partir daí, João até se propõe a levar o menino a São Paulo, onde o suposto pai da criança reside. Lá descobre que o pai que Duda julga ser seu, o homem da foto que a mãe entregara, não é realmente o pai do garoto. Resolve, então, mentir para Duda que seu pai morrera. Desolado, o menino vive momentos de tristeza, aquela forte tristeza da criança-sem-ninguém que vê fatalmente perdida a única esperança de encontrar quem lhe acolhesse em família. Depois, já tendo os laços com João estreitados, e este não estando tão ríspido com ele como antes, ao contrário, já sendo capaz de até mostrar certa acolhida, acaba afirmando João como a figura de um pai - que desde o início do convívio, sem licença, já o fizera tal. 
      Ao mesmo tempo que João se propõe a resolver a vida do menino Duda, ele vai se voltando à sua, e a resolvendo aos poucos. Como se além do aprendizado com a dor da criança abandonada à espera de um dia poder encontrar o pai e não poder, aprendesse na relação branda de afeto, restituir a vida que deixou por viver tempos atrás. Assim, decide procurar pela filha; consegue se desculpar pessoalmente e reatar o vínculo familiar que a ela só restou com a avó paterna. Feito isso, João acaba ficando com a menina e Duda, agora efetivamente dois filhos, com os quais passeia de caminhão, mas perfazendo outra viagem que não a de condenação: a de momentos agradáveis em família.
      Um drama construído sobre as mais fortes e belas cenas de carinho e atenção nas relações fraternas, À Beira do Caminho mostra através dos adultos que muitas horas as crianças assumem, e as crianças por que muitas vezes passam os mais velhos, como é salutar para o homem desintricar-se do que permanece do tempo que ficou para trás, solucionando o necessário, bem como cultivar e colher das relações de afeto (com crianças ou não) a brandura e o alimento que são necessários constantemente para enfrentar os dissabores que insurgem na vida. Senão, como o João do início da história, colocar-se-á a vida sempre à beira do caminho, como do abismo, permanentemente, sem, no entanto, cumprir esse mesmo caminho.

   Um pouco das cenas do filme podem ser conhecidas pelo trailer abaixo.
   
   A todos os amantes de um bom filme de drama,"boa sessão!".
  


   

2 comentários:

Ana Amélia disse...

Oi Bruninha!!

Ao entrar no blog de uma colega, lembrei do seu e resolvi passar por aqui! Gostei muito da resenha do filme "À beira do caminho"... já entrou para minha lista de movies-to-see! hehe...

Vc continua escrevendo muito bem.. não que isso seja novidade! hehe, mas é sempre bom ler textos de colegas... abraços e bjão!

Ana Amélia.

Bruna Caixeta disse...

Oi, Ana!!

Felicidade tê-la por aqui! Obrigada pela presença e pelas palavras.

"À Beira do Caminho" vale mesmo a pena ser incluído na lista dos filmes para serem vistos. Ele presenteia o público com cenas bonitas e emocionantes de atenção e carinho entre criança e adultos. Vale a pena.

Grande abraço para você.